20 novembro 2010

Chatô, o rei do Brasil



Um jornalista que sabia mais do que ninguém usar a imprensa como o quarto poder de um governo, esse era Assis Chateubriand imortalizado na obra de Fernando Morais. “O homenzinho mais fantástico” que Elza Maxwell já conheceu era um sujeito astuto que por muitos anos permaneceu no encalço de presidentes com suas opiniões sempre exageradas. Taxado de antiético, chantageador e mau caráter Chatô colecionou inimigos ao longo de seus 76 anos de vida. Fundou os Diários Associados, uma rede de jornais, rádios e emissoras de TV comparada a de William Hearst (o suposto Cidadão Kane). Escreveu quase que até o último dia de sua vida. Em 1960 ficou tetraplégico, falecendo em 1968, depois de agonizar durante anos com a esperança de um dia voltar a ser o enfurecido jornalista que fora até ali.

Assis Chateubriand nasceu na Paraíba e foi criado em Pernambuco. Ainda criança enfrentava dificuldades em se comunicar por ser gago. Fato que o levou a ser alfabetizado já com nove anos. Formou-se em Direito e passou a escrever artigos em jornais pernambucanos. Aos poucos ganhava fama por não medir palavras e disparar ataques a autoridades locais. Defendeu sempre o liberalismo econômico e o interesse das empresas o que fez com que ganhasse amizades entre a elite nordestina.

Conquistou seu espaço no Nordeste, mas percebeu que ali estaria longe dos principais acontecimentos do Brasil. Mudou-se então para São Paulo, decidido a um dia ter seu próprio jornal. Chatô, que não era bobo, sempre esteve ao lado de industriais, banqueiros e burgueses, defendia os interesses destes em seus artigos. Por esse fator, ganhou a simpatia da elite cafeeira. Mesmo sem ter dinheiro, conseguiu convencer os cafeicultores paulistas a financiar a compra de um jornal para defender os interesses burgueses na capital paulista. Assim, ainda com 21 anos tornou-se dono do O Jornal.

Ciente que não poderia pagar tal investimento, Chatô propiciou a seus parceiros uma sociedade onde todos seriam acionistas do ainda imaturo Diários Associados. Isso virou característica do jornalista, sempre convencendo investidores a injetar dinheiro em seus projetos megalomaníacos, Chatô conseguia realizar grandes projetos sem ter dinheiro. Além da rede de jornais, criou o projeto “Dê asas a juventude” que convencia empresários a doar aviões para a pequena frota brasileira e o Museu de Arte de São Paulo, o Masp.

Temendo a força que os Diários Associados ganhavam, os políticos brasileiros passaram a respeitar Chateubriand. Cada vez mais, o jornalista se afirmava no cenário político como peça fundamental para se obter vitórias. Sem nenhuma vergonha, vendia matérias para candidatos ao governo que quisessem aparecer em um de seus jornais. Os que não tinham o apoio de Chatô sofriam com constantes ataques em artigos publicados em toda rede do jornalista. Assim, ele passou a figurar nos bastidores dos principais acontecimentos históricos do Brasil.

Em sua vida particular Chatô não obteve o mesmo êxito da carreira profissional, e nem o quis. Ao longo de sua vida ele teve dificuldades para viver em família. Sempre colocou o trabalho a frente de qualquer outra coisa. Suas esposas eram abandonadas em mansões, assim como seus filhos que nunca se deram muito bem com o pai. Sua vida pessoal foi sempre cercada de escândalos, que chegavam desde as manchetes dos jornais da oposição até o gabinete do presidente.

Com suas empresas ganhando cada vez mais poder, Chateubriand se mostrou um homem autoritário. Usava seus jornais como ferramenta política o que acabava por irritar seus repórteres. Por esse fator, Chatô perdeu grandes jornalistas como Samuel Weiner, Joel Silveira e Carlos Lacerda. Levava suas disputas políticas até as últimas conseqüências, chegando a cometer crimes que passavam impunes graças ao seu poder. Sempre teve consciência do que um jornal era capaz de fazer e usava isso como arma para conseguir o que queria.

Em 1960, Chatô sofre de uma trombose o que o leva ao coma. Passado alguns meses, enquanto muitos já esperavam sua morte, volta à lucidez com todo seu corpo paralisado. Tetraplégico ele passa oito anos agonizando em cima de sua cama. Ainda assim, escrevia quase que diariamente seus artigos com os poucos movimentos que podia realizar. Em 1968 morre vítima de uma parada cardiorrespiratória.

Na obra de Fernando Morais é possível observar toda a linha do tempo que envolve o jornalismo brasileiro. Desde os lendários Jornal do Commércio e O Pasquim, até os atuais poderosos O Globo e Folha de São Paulo. Mais do que isso o livro passa por toda a história política brasileira, contando os detalhes de golpes de estado, de conchavos, de bastidores e de histórias que marcaram a história. Apesar de a obra ser relativamente grande, ela é também rica, não deixando escapar nenhum detalhe por mais insignificante que pareça. O autor usa técnicas do Novo Jornalismo descrevendo cada cenário, desenrolando cada cena, escrevendo cada diálogo de uma forma que dá a impressão no leitor que o narrador presenciou tudo.

Chatô é uma obra biográfica que não se prende apenas a história do objeto analisado, ela flutua por toda a história brasileira, mas sem perder o foco no personagem. Um pouco pela peculiaridade da vida de Assis Chateubriand um pouco pela genialidade de Fernando de Morais, o livro acaba por ser uma obra obrigatória a qualquer aspirante a jornalista.

17 novembro 2010

Eugênio Martini: Lutando contra todos em busca de um mundo melhor



Em uma pequena sala no Térreo da Faculdade PIO XII, Eugênio Martini expõe durante alguns dias toda sua paixão pela telefonia. De escola em escola, o responsável pelo “Museu do Telefone” enfrenta uma série de dificuldades para se fazer o que acha que é certo. O empresário tem uma loja de celulares no Centro de Vitória, mas o que o move mesmo é a paixão pelas pessoas. Envolvido em campanhas para a preservação da cultura e do meio ambiente, Martini esbarra na legislação para alcançar seus objetivos. Ele já tentou abrir ao público sua coleção por duas vezes, mas foi fechado pelos fiscais do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan, e da Prefeitura de Vitória. Porém, Martini é persistente. Ele batalha para levar o conhecimento da telecomunicação brasileira às pessoas: “para mim, a Felicidade é não ter nada e não desejar nada.

Nascido em Itajaí, interior do estado de Santa Catarina, Martini foi criado pelos avós. Em casa, os avós sempre incentivaram a cultura. A paixão por coisas antigas veio do avô que possuía um Ferro Velho. “Uma das lembranças que eu tenho daquela época era um Ford 29 dele que funcionava à manivela”, lembra. Ainda criança entrou para o Colégio de Padre onde aprendeu filosofia, história, cultura e francês. Jovem e com uma vasta bagagem cultural, não quis seguir os conselhos do pai que o queria trabalhando na roça. Em 1964, Martini passa num concurso da Marinha Brasileira para ser Auxiliar de Comunicação, telegrafando mensagens. Seu primeiro contato com a telecomunicação.

Martini morou em várias cidades de Santa Catarina. Passou por Joinville, Florianópolis e Blumenau, sempre trabalhando no comércio. Infelizmente, perdeu todo o seu patrimônio nas Grandes Enchentes de 83 e 84. Sem grandes perspectivas em uma cidade arrasada, ele junta tudo o que restou e se muda para Vitória, no Espírito Santo. Buscando reconstruir sua vida, ele chega ao estado em 1985. Em terras capixabas, seu primeiro emprego foi como vendedor de carros. Logo, passou a trabalhar por conta própria comprando dívidas dos consórcios de carros de outras pessoas. Além dos carros, Martini passou também a comprar linhas telefônicas, uma novidade no Espírito Santo e acessível apenas para os mais ricos.

Na época os aparelhos pertenciam todos à companhia telefônica Telebrás. O telefone estava sempre acompanhando a linha. Quem comprava a linha telefônica, recebia a posse do aparelho que continuava sendo da empresa. Com o avanço tecnológico, a companhia passou a oferecer mais frequentemente novos aparelhos. Martini começou a guardar os mais bonitos e exóticos.

Como corretor de linhas telefônicas, logo se viu com uma coleção significante. Outras pessoas começaram a perguntar sobre a coleção. Muitos doavam aparelhos raros, contavam histórias e isso despertou um interesse seu em abrir um Museu.

Em 1997, Martini realiza seu sonho e abre o Museu do Telefone, no Centro de Vitória. Aos poucos, ele dedica cada vez mais tempo ao seu projeto: estudando livros que encontra sobre o assunto, pesquisando, fazendo a manutenção do acervo e limpando o local da exposição.

O que o mais motiva é a satisfação das pessoas ao visitar o Museu. “As pessoas se aproximam achando tudo muito estranho e confuso a princípio. Depois saem da exposição maravilhadas. Uma senhora chorou quando viu um gramofone, lebrou de seus pais na hora. Às vezes, a transformação era tanta que me dava até vontade de chorar”, revela Martini.

Com visitas cada vez mais freqüentes, alguns problemas começam a aparecer. Muitas peças quebram, são roubadas, mas isso não o desanima: “a exposição é mais do que o material que está ali, é a volta ao passado. Poderia ter um material muito mais rico se limitasse as pessoas durante a visitação, mas o objetivo de um museu não é esse. O que eu quero é partilhar.”

Em 1999, no entanto, a fiscalização do Iphan fecha o Museu do Telefone por estar vinculado apenas a uma pessoa física. Triste, Martini fica então impossibilitado de realizar seu objetivo de partilhar a sua obra com as pessoas. As peças ficam guardadas por algum tempo em seu prédio comercial.

A solução encontrada por ele para manter o Museu foi ir de encontro com o público. “Já que eu não podia mais abrir o meu espaço, comecei a levar algumas peças em feiras, escolas, empresas, onde me convidasse eu levava o Museu”, conta. Mesmo assim, Martini não se achava satisfeito a respeito de seu objetivo. Em 2006 reabre o Museu, mas novamente é fechado em 2009. Desta vez pela Prefeitura de Vitória. O motivo era por ele estar financeiramente impossibilitado de arcar com as exigências da prefeitura.

Forçado a se afastar de seu projeto com o Museu, ele passa a se envolver com outros projetos. Entre eles, ajuda a instituir na Grande Vitória o Ciodes, Centro Integrado Operacional de Defesa Social, e como comerciante cria propostas para melhorar a segurança no Centro de Vitória. Durante as eleições de 2004 conseguiu políticos que apoiassem sua proposta de “menos armas e mais amor”. Após a eleição, seu projeto ficou esquecido. Sem obter sucesso, Martini lança um novo projeto voltado ao meio ambiente.

O Projeto “Sapinho, adote uma árvore” parte da intenção do comerciante em juntar o lixo tóxico de pilhas e baterias, trocando por sementes de árvores.Mais uma vez, Martini tem seu projeto limitado pela legislação. Segundo ele, apenas uma empresa no Brasil recolhe esse tipo de material. Essa empresa fica em São Paulo e só recebe o lixo de pessoas jurídicas. “O governo não incentiva a coleta consciente desse material. Em vez de receber uma gratificação, sou obrigado a pagar para essa empresa recolher isso”, desabafa Martini.

Persistente, Martini pede mais ação do governo. Para ele, coisas simples de resolver são esquecidas pelos políticos. “Vitória tem um sitio histórico incrível, é a segunda capital mais antiga do Brasil e nada se tem feito para manter essa história viva. No dia do museu, liguei para vários deles para visitar, muitos deles sequer estavam abertos”, revela.

Hoje em dia, ele continua em busca de cumprir seu objetivo, aparentemente cada vez mais difícil. Ainda leva o Museu do Telefone para Feiras e escolas. Porém às vezes acaba sendo prejudicado por ser tão determinado com a sua missão: “a realidade é que perdi minha vida aqui. Privo-me de sair com a minha família para cuidar do museu. Quantos e quantos finais de semana já perdi limpando peças e fazendo manutenção?”.

Apesar de respeitar, muitas vezes sua família fica na bronca por ter que dividir espaço com o Museu. “O que me distancia um pouco de outras pessoas é o amor, isso falta na sociedade. Hoje, criou-se o medo e valores foram perdidos. Não podemos abraçar nossos filhos que já corremos o risco de ser chamado de pedófilo, não se confia mais em ninguém”, conta Martini.

Desse modo, depois de contar sua história, de criticar o governo, de nos ensinar seus conhecimentos, Martini acaba desabafando um pouco. E ouvir é o mínimo que podemos fazer para compensar alguém que se sacrifica para fazer algo melhor para o mundo.

Clique na imagem e veja a galeria de fotos do Museu do Telefone

15 novembro 2010

Projeto da Vale coloca Iema em situação delicada

Na última quinta-feira, dia 14, uma manifestação aconteceu nas portas da sede do Iema, Instituto Estadual de Meio Ambiente, em Cariacica. Estudantes e militantes de movimentos sociais impediram que funcionários do órgão entrassem no prédio. A medida era um protesto contra a indecisão do Instituto a respeito da licença prévia que irá permitir a Vale de construir a Companhia Siderúrgica de Ubu, em Anchieta. Os manifestantes querem que a licença seja negada, como foi sugerido pelos técnicos ambientais do órgão e não atendido pelos diretores. Questões socioambientais tornam esse processo complexo, entenda ele agora.

Há algum tempo a Vale pretende instalar, em Anchieta, uma siderúrgica para a produção de placas de aço. Em audiência pública do mês de setembro, o representante da CSU Dimas Bahiense disse que o compromisso é fazer um projeto de última geração. Segundo ele, a empresa já encomendou diversos estudos e investiu em aparelhos modernos para evitar o impacto na região. A siderúrgica irá contribuir em projetos para auxiliar na área de infraestrutura dos municípios, trará emprego e desenvolvimento para o interior do estado. Estima-se que no pico da obra 20 mil pessoas serão empregadas. O plano é capacitar 14 mil pessoas da região, já que o estado não pode suprir essa demanda atualmente. Na fase de construção serão gastos de R$ 2,3 bi a R$ 3,7 bi. Quando entrar em operação, a expectativa é que a companhia movimente por ano cerca de R$ 8 bi, o que irá trazer uma forte geração de tributos. Até 2015 cerca de R$ 6 bi entraram nos cofres do Estado e R$ 10 bi nos cofres federais.

Apesar de todo esse desenvolvimento, especialistas condenam o projeto. Eles acusam que se concretizado essas obras gerarão transtornos aos moradores da região. A principal queixa é a respeito da área onde a CSU seria construída, ocupada por comunidades indígenas e quilombolas na Chapada do Á e Monteiro. Os moradores não aceitam serem retirados do local, dificultando o processo. Eles ainda acusam a empresa por enviar assistentes sociais que manipulam moradores pouco instruídos, tentando os convencendo a sair do local. Segundo o site Século Diário, em recente plebiscito 93% da população dessas comunidades disse não vender seus terrenos. Além dessas, inúmeras questões foram levantadas. A favelização após a construção da CSU como aconteceu na época da construção de Brasília com os candangos; a Poluição e assoreamento do Rio Benevente que abastece os municípios locais; e ainda a mudança da temperatura de águas marítimas com o uso delas para resfriar os reatores, o que prejudicará os pescadores.

Tantos empecilhos levaram ONG’s, estudantes e movimentos sociais a protestar contra o projeto. Eles acusam a empresa e o governo de estar fazendo todo o processo às escondidas. De fato, as audiências públicas foram fechadas para convidados e ocorrem sempre longe da região metropolitana de Vitória. Outra acusação é de que o IEMA, órgão responsável pela licença, encontra-se desorganizado politicamente. Segundo os manifestantes, o órgão é composto de diretores que são escolhidos por indicação de deputados, sem o uso de qualquer critério de capacidade. As acusações ganharam mais força quando esses diretores não levaram em consideração o parecer negativo de técnicos ambientais que foram contra a licença. Na manifestação do dia 14 de outubro, os funcionários inclusive deram apoio aos manifestantes. Eles estão há dois meses sem salário e reclamam do autoritarismo dentro do órgão. Em audiência, o estudante Vitor César Zille questionou a Diretora-Presidente do IEMA Sueli Tonini a respeito desse fato. Segundo ata da audiência publicada no próprio site do Iema a diretora respondeu:

  • “Os técnicos são respeitados. Não impusemos constrangimento nenhum a eles para rever seus posicionamentos. Porém a diretoria assumiu a responsabilidade considerando os aspectos da urgência, da necessidade de garantir o desenvolvimento ao Estado, de geração de empregos, de agregação de valor ao produto, da contingência do momento e da geração de conhecimento a não aceitar a opinião dos técnicos. A sua fala meu rapaz não foi adequada. Mais tarde você deve refletir e repensar no que disse”, respondeu ao estudante.

Bruno Fernandes do Gama, Grupo de Apoio ao Meio Ambiente, disse que o diálogo com a sociedade é falho e que o Ministério Público deveria atuar de forma mais independente. “A Prefeitura deu anuência para o empreendimento em local que não pertence a empresa. A manipulação está acontecendo em todos os órgãos”, contou Bruno.

Afirma-se nos bastidores que a licença ambiental para a CSU já está pronta, mas o Iema depende que a compra do terreno na Chapada do Á e Monteiro seja efetivada. Enquanto isso, a sociedade civil continua tentando fazer diálogo com o órgão, organizando reuniões para convencer os diretores do impacto que essa construção irá causar. Mas a diretoria do Iema se esquiva fugindo da tomada de uma decisão, arrastando-a para novos capítulos.

13 novembro 2010

O crescimento do poder aquisitivo da classe C



Chamada de “nova classe média”, a classe C engloba mais da metade dos brasileiros, cerca de 94,9 milhões de pessoas. O grupo passou a concentrar 46,24% do poder de compra dos brasileiros, superando as classes A e B, com 44,12%.Nos últimos anos uma série de políticas econômicas possibilitou a ascensão desse grupo. Entre elas pode-se destacar o aumento real do salário econômico em 53%, o Bolsa Família, além do incentivo ao micro e pequeno empresário. É o que afirma Marcelo Neri, professor de economia da Fundação Getulio Vargas.

Diego Teixeira, de 24 anos, é encostado pelo INSS por conta de uma doença na medula óssea. Com o dinheiro de sua pensão, está investindo em uma oficina de serralheria junto com seu pai, Paulo Teixeira. Paulo é serralheiro há 20 anos, sempre trabalhou como autônomo e nunca teve oportunidade de investir. Agora com a renda extra, eles pretendem gastar com compra de material e divulgação do novo empreendimento.

Além de permitir que a “Nova Classe Média” possa entrar no mercado não só como empregados mas também como empresários, as políticas econômicas empregadas no último ano permitiram que as pessoas pudessem consumir mais. De 2003 até 2010 o número de cartões de crédito no Brasil cresceu 400%, pulando de 23 milhões de cartões para 193 milhões. Outro fator que contribuiu para esse crescimento de consumo foram as negociações de dívidas antigas. Para retirar o nome da SERASA, as empresas oferecem descontos e parcelamentos, permitindo que antigos consumidores possam voltar a consumir. Atualmente a participação da classe de baixa renda no mercado de consumo chega a representar 65% dos lares brasileiros. As classes C D e E, movimentam aproximadamente 512 bilhões de Reais por ano.

Há 23 anos Brás e Jones abriram uma farmácia no bairro Santana de Cariacica, de maioria de moradores pertencentes a classe C. Filiados a Rede Farmes, eles representam hoje a farmácia mais próspera da rede, a Farmácia Veneza. Esse título só veio a partir das boas vendas realizadas, que surpreenderam até mesmo os empresários. “O produto mais procurado, o que nós mais lucramos aqui são os cosméticos”, contou Brás. Com a melhora do poder aquisitivo, as pessoas compram os produtos mais caros. Eles preferem comprar de uma marca conhecida do que comprar duas vezes.

No entanto, a desigualdade brasileira está entre as dez maiores do mundo. 10% dos brasileiros mais pobres recebem 0,9% da renda do país, enquanto os 10% mais ricos ficam com 47,2%. Com 53,9 milhões de pobres, o equivalente a 31,7% da população, o Brasil aparece em penúltimo lugar em termos de distribuição de renda numa lista de 130 países, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

A cada dia a classe média brasileira ganha mais destaque e mais importância no enário nacional. Sem ter grandes propriedades, mas contando com a maioria dos consumidores, a classe chama a atenção das empresas.
*Fobenet recomenda: A Nova Classe Média: O lado brilhante dos pobres

28 setembro 2010

Os "filhos de Cariacica"


A cada ano surgem mais candidatos paroquiais, filhos da terra. Veja o exemplo de Cariacica e como esse tipo de político atrapalha o ES.



O município de Cariacica representa hoje uma realidade característica dos subúrbios de regiões metropolitanas de todo o país. A cidade tem uma grande população e pouco dinheiro. Mas para buscar os votos dessa grande população, muitos candidatos se dizem filhos da terra na hora das eleições e não só conseguem apoio com as autoridades locais, como trazem seus aliados para apresenta-los ao seu recém adquirido curral eleitoral.

Marcelo Santos (PMDB), Aparecida Denadai (PDT) e Lúcia Dornellas (PT) são os que aparecem melhor nas pesquisas para deputado estadual. Ambos se baseiam no discurso de representantes do povo cariaciquense e tem os seus padrinhos, que exercem de suas “autoridades” para os batizar como filhos legítimos do município.

Marcelo Santos (PMDB)
Filho adotivo do ex-prefeito de Cariacica Aloísio Santos, Marcelo foi quem seguiu a carreira política do pai na família. Apoiou-se no sobrenome do pai para se eleger pela primeira vez, mas hoje já começa a dar seus primeiros passos solo. Filiou-se ao PMDB só em outubro do ano passado, mas pelo o que diz em seus comícios, é parceiro dos membros de sua base há anos. Em evento realizado nessa segunda-feira 27 de setembro (seis dias do pleito), apresentou a comunidade seus aliados, que segundo ele estão ao seu lado desde a época em que seu pai era vivo (Aloísio faleceu em 2005). Marcelo é primeiro nas pesquisas do município, mas, como um novo empregado, quer mostrar sua capacidade. Trouxe a Cariacica os candidatos Lelo Coimbra (Ex vice governador de Paulo Hartung e candidato a deputado federal) e Ricardo Ferraço (Membro do ministério nos dois mandatos de Paulo Hartung e candidato a senador) para simplesmente apresenta-los ao povo cariaciquense. As eleições de 2010 parecem ser, para Marcelo, o momento de fortalecer seu curral eleitoral e suas bases eleitorais para vôos mais altos em 2014.

Lúcia Dornellas (PT)
Lúcia é a candidata queridinha da Prefeitura de Cariacica. Do mesmo jeito que Lula move com sua popularidade a campanha de Dilma Roussef, Helder Salomão usa os simpatizantes de seu mandato para fazer Lúcia eleita. Ela é pouco conhecida pelo povo cariaciquense. Assim como Dilma, Lúcia foi o braço direito de Helder quando este era deputado e em seus dois mandatos como prefeito. Prefeito este que venceu inclusive Marcelo Santos e Aparecida Denadai nas últimas eleições municipais. Também semelhante a Dilma Roussef, Lúcia parece um pouco perdida saindo como candidata. Tem boa aprovação graças as fortes alianças de seu partido que além de Helder conta com a deputada federal candidata a reeleição Iriny Lopes. Lúcia é a esperança de Helder para continuar tendo influência em Cariacica. O prefeito conta com a oposição de Marcelo e Aparecida na Assembléia Legislativa, o que representa um certo boicote ao município. Por parte de Aparecida a oposição é declarada, porém Marcelo Santos parte de um princípio mais discreto. O candidato do PMDB disse recentemente em um comício: “Na política não vivemos só de ataques, aprendi que se nós não podemos ajudar, atrapalhar é que não vamos. Por isso, serei o apoio a qualquer prefeitura que esteja no poder em Cariacica.” Desse modo, Marcelo mostra toda esperteza política herdada de seu pai. Sabendo da popularidade de Helder não se opôs a ele para não perder votos com o público do atual prefeito.

Aparecida Denadai (PDT)
Aparecida é a filha bastarda de Cariacica. A candidata a reeleição para deputada estadual não conta com apoio de grandes autoridades do município. Sua candidatura foi baseada sobre tudo na morte de seu irmão o advogado Marcelo Denadai que morreu em 2002 e virou mártir da luta contra a corrupção no ES. Advogada, ela tem seu histórico na luta pelos direitos humanos e nunca havia se candidatado até o sobrenome Denadai ganhar a mídia. Desde então, assumiu o município de Cariacica como sua terra, mesmo que a cidade não tenha correspondido tanto “amor” de Aparecida. Ela foi então adotada por outro município, Santa Leopoldina. A candidata do PDT conta com o dinheiro do Caixa Dois feito com licitações da prefeitura de Santa Leopoldina e da construtora Impact, cujo dono é irmão do ex-prefeito do município Ronaldo Prudêncio. O esquema veio à tona a menos de um mês das eleições. Ronaldo Prudêncio foi afastado da prefeitura por ser o cabeça do esquema, Aparecida tem envolvimento direto no escândalo. A candidata conta inclusive com parentes de Prudêncio nomeados em seu gabinete. O dinheiro desviado foi destinado a campanha dos principais nomes do partido no estado: a candidata a deputada Federal Sueli Vidigal, esposa do atual prefeito da Serra e presidente do PDT no ES, Sérgio Vidigal, e Aparecida Denadai. O interesse de Aparecida em Cariacica parece ser somente o de encontrar um curral eleitoral com uma concorrência menor na Grande Vitória, mas de grande população, onde possa gastar o dinheirinho trago do interior do estado.

Assim como Cariacica, outras cidades tem seus candidatos “paroquiais”
Os representantes do governo costumavam ter atenção voltada para o dinheiro arrecadado pelo estado e os gastos destinados para os grandes municípios. Se sentindo abandonados os eleitores de cidades populosas porém esquecidas, começaram a eleger candidatos paroquiais. Ou seja, o público quer votar em quem defenda os interesses de seu município esquecendo que o deputado é estadual, que deve zelar pelo estado todo, não com interesse em apenas uma cidade. Assim aconteceu na eleição de Theodorico Ferraço (DEM) da paróquia de Cachoeiro, Robson Vaillant (DEM) da paróquia de Alegre, Da Vitória (PDT) da paróquia de Colatina, Paulo Folleto (PSB) da paróquia de Colatina, entre tantos outros.

Pode-se pensar que a democracia ganha com isso, o que é verdade, apenas na teoria. Na prática, o que se vê é um cenário onde deputados buscam os interesses de única e exclusivamente suas cidades e não discutem políticas públicas de interesse do estado como um todo.

Quando surge uma verba, em vez de se discutir planos de desenvolvimento, de investimento em educação, meio ambiente ou qualquer outra questão social, o dinheiro é dividido entre os municípios dos deputados para serem gastos em obras que deviam ser de responsabilidade das prefeituras. Depois, quando voltam às campanhas, os mesmos candidatos partem do discurso de quanto cada um destinou ao município para atrair esse tipo de eleitor paroquial. Precisamos eleger deputados estaduais de fato, não filhos de Cariacica, nem de Domingos Martins, nem da Serra, mas filhos sobretudo do Espírito Santo.

18 setembro 2010

A Inteligência Política de Marina


Hoje, dia 17 de setembro, fui ao Clube Álvares Cabral acompanhar a visita da candidata Marina Silva ao ES. Entre todos aqueles clichês que a imprensa costuma noticiar e perguntar, mantendo em funcionamento o tal "museu de velhas novidades" que é a mídia, uma coisa me chamou atenção e me surpreendeu. Enquanto esperava a chegada da candidata, pude observar que seu eleitorado era diversificado de tal maneira, que é de se assustar que não haja conflitos entre eles.

No evento pude notar jovens de classe média que se identificam com a causa do meio ambiente e fazem militância para a campanha. Vi empresários de grande destaque, debaixo de sol, esperando para entregar propostas para a candidata. Havia forças políticas locais, como a de Vitor Buaiz, apoiando Marina. Vi crianças a seguindo, donas de casa, pastores evangélicos, beatos católicos, senhoras de idade, ativistas esquerdistas, enfim, uma grande quantidade de grupos apresentando apoio a ela.

Longe de querer fazer um lobby pró Marina, quero apenas registrar o que essa acreana promoveu ao conseguir misturar ainda mais a sociedade brasileira. Somente alguém de muita inteligência política e malandragem para ter em suas mãos :

- os principais líderes da Igreja Evangélica como um todo, que representa boa parte da população de baixa renda no Brasil;

- os empresários que dominam cada região do Brasil;

- Os estudantes do ensino Superior, que são os que conseguem dominar a mídia por serem os potênciais futuros consumidores;

- e de quebra conquistar a Classe D, pelo simples fato de ter saído de origens tão miseráveis como da classe pobre.

A astuta Marina pode ser acusada de não entender de política, quando escolheu não fazer alianças. Mas mostrou que entende o eleitor, por aproveitar um cenário em que os dois principais partidos se gladeiam, um acusando e enfraquecendo o outro, em seu favor. Marina se desvencilha de ambos, mas ao mesmo tempo não perde relações, conseguindo se manter como poucos em cima do estreito muro que os separam.

Pois bem amigos, Marina Silva mostra que aprendeu direitinho a lição de casa deixada pelos presidentes anteriores. Ela tem a malandragem de fazer inveja a Getúlio Vargas e a astutez de JK ao ser amiga de todos. Penso que para ganhar as eleições só falta ter a simpatia de Lula, fato que como disse no ínicio do texto, não deve estar longe de acontecer.

10 setembro 2010

"Cansado de levar pernada? Vote no Saci!"



Ator de um personagem só, assim é Manoel Claristenes, conhecido como Saci Pererê. O ator teve seu auge nos anos 80 participando do Sítio do Pica-Pau Amerelo. Depois do término do programa, Saci volta a TV como o grande personagem do horário eleitoral capixaba. Saci, que é conhecido no folclore brasileiro como alguém que prega peças e engana as pessoas, garante que nunca gostou de política e seu maior interesse na candidatura é se aproveitar da mídia.


Ao convidá-lo para uma entrevista Saci logo se dispôs a ir ao meu encontro na Ufes, “Gosto do ambiente verde de lá, vai ficar melhor para as fotos”, falou ao celular. Encontro-o no dia seguinte, reconheço de longe todo caracterizado e pulando corda. Por onde passa, Saci gera comentários das pessoas. Ele assume o personagem, é travesso. Com 46 anos e apenas uma perna, ele se exibe subindo em postes de luz e pedras, dizendo ainda que anda de patinete (confira!), joga futsal e luta capoeira. Pergunto como gosta de ser chamado, ele já tinha uma resposta ensaiada: “Você acha que o Pelé quer ser chamado de Edson ou Pelé? O Zico quer ser chamado de Arthur ou Zico? Comigo é a mesma coisa, ganhei a minha vida sendo Saci e é assim que sou conhecido”, responde ele.


Saci nasceu no centro de Vitória, Espírito Santo, próximo ao Forte São João. Quando era jovem, disputava uma partida de futebol na escola, quando levou uma pancada em sua perna direita. Devido a um erro médico dos precários hospitais públicos da época, teve sua perna amputada. Não se abateu. Começou a pensar no que fazer a partir de então. Foi quando, na década de 80, viu a oportunidade numa apresentação do Sítio do Pica-Pau Amarelo no município da Serra. Sabendo que todos os sacis da trupe tinham as duas pernas, ofereceu-se aos produtores. Conseguiu falar com Samuel dos Santos, o ator que fazia o papel de Tio Barnabé, que o colocou na peça. Viajou para Taubaté, em São Paulo sede do legítimo Sítio. Depois foi para o Rio, ficando mais perto do estúdio da Rede Globo.


Com o término do programa, Saci passou a fazer peças e se apresentar em eventos. Engana-se quem acha que foi prejudicado ao sair da TV, “Não podia ficar a vida toda só na TV, o artista precisa se renovar. Meu forte não é a Televisão, onde pode-se usar a tecnologia para esconder a perna do ator, meu forte é o teatro onde ninguém representa tão bem o saci, quanto eu”, disse Saci. Ele ainda rejeita os empresários: “empresário só quer saber do dinheiro não pensa na carreira do artista. O meu tentava me impedir de apresentar em determinados lugares, por isso não uso mais”. Hoje, Saci é funcionário do Estado, apresentando em eventos, escolas, peças de teatro educativas, sempre atuando como Saci.
A idéia da candidatura surgiu do próprio partido, que o convidou em 2008 para ser candidato a vereador em Vila Velha: “Nunca tive a intenção de sair candidato, mas os políticos não são burros. Eles disseram para mim que não queriam candidatar o Manoel, eu sairia na eleição com o nome de Saci”, revelou. Saci admite nunca ter gostado de política, conta ainda seus reais interesses em sua candidatura, “perdi mercado com a proibição dos showmícios. A candidatura é uma forma de sobrevivência, o artista é muito desvalorizado”, revela. Porém ele não deixa de fazer projetos caso seja eleito, pretende trabalhar numa plataforma de proteção ao meio ambiente, o Guardião das matas: “Monteiro Lobato trabalhava essas questões de aquecimento global desde aquela época, tentava introduzir uma consciência ambiental nas crianças através de sua obra”, conta.


Sua campanha é baseada na busca dos votos de protesto. Diante de um cenário de corrupção, muitos eleitores votam em candidatos bizarros só para “sacanear”. Sobre as críticas de não levar a política a sério, ele logo rebate: “O artista tem que ser criticado. Não viso ganhar a eleição, se ganhar ótimo, tenho minhas propostas para cultura e o meio ambiente. Caso contrário, pelo menos divulguei o folclore brasileiro e o meu trabalho”.


A impressão deixada pelo Saci é das duas uma: ou ele representou por tanto tempo o Saci Pererê que acabou adquirindo características do personagem, ou foi escolhido a dedo pelo destino para representar tão bem essa figura do folclore brasileiro.

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24 agosto 2010

Relatos de um Réporter Inexperiente


Diante das crises de mercado, do futuro incerto e do salário cada vez menor, o jornalismo continua como uma das profissões mais almejadas pelos estudantes. Talvez fugindo das exatas e da grande concorrência em Direito, a escolha de jornalista pareceu óbvia para mim. Aos poucos fui me contaminando pela carreira. Percebi o quanto de poder ela exerce sobre o mundo, vi nela uma oportunidade de tentar botar em prática tudo que sempre acreditei, começar minha luta. Minha primeira experiência como 'réporter' veio no último dia 20, quando a candidata Dilma veio ao ES.
Durante todo um semestre ganhei um pouco de conhecimento teórico na faculdade. A prática eu acreditava que ganhava apenas escrevendo neste blog. Como eu estava enganado. Talvez o mais próximo de reportagem que eu já havia chegado foi na matéria Diário de Bordo, em que a bordo de um caminhão passei algumas semanas viajando pelo Brasil. Também pude sentir um pouco do que é escrever suas observações como jornalista no post de minha primeira caravana. Porém não estava lá como réporter, não havia sentido as dificuldades de ser jornalista.
A oportunidade de botar em prática tudo que aprendi veio só no segundo semestre da faculdade. Precisando fazer um blog para uma determinada matéria, eu mais alguns amigos escolhemos o tema política, área pela qual sempre quis atuar.


Logo na primeira pauta, tive a oportunidade de ir de encontro com uma dos 'presidenciáveis', Dilma Roussef. Eu e um colega de sala chegamos na Praça Costa Pereira, em Vitória, por volta das 10h. Entrevistamos alguns candidatos ali presentes, fizemos raiva em alguns pelas perguntas idiotas, deixando trasparecer nossa inexperiência. Mas nada que prejudicasse o andamento da matéria.

Dirigimo-nos para a rua onde a candidata iria desfilar em carreata. Havia ali uma multidão, mas não de eleitores mais entusiastas e sim de funcionários/militantes de outros candidatos. Eles balançavam suas numerosas bandeiras pela rua, talvez estariam ali tentando aproveitar um pouqinho da mídia em cima da candidata. E não eram só candidatos de pouca expressão não. Candidatos do porte do senador Magno Malta, do senador Ricardo Ferraço, do prefeito João Coser e do senador e candidato a governador Renato Casagrande se acotuvelavam na expectativa de ficar ao lado de Dilma. Vitória de Ferraço e Casagrande.

A candidata Dilma estava a caminho. Ela chegara ao Aeroporto de Vitória e partia em carreata até o centro de Vitória, de onde partiria em carro aberto. Sua visita ao estado significava pouco para ela, acredita-se que o ES tenha 1% dos eleitores do Brasil, mas muito para os candidatos daqui. Não só candidatos, a imprensa também esperava muito por sua visita.

Enfim, ela chega. Percebo sua presença só com a confusão gerada pelos fotográfos. Eu e meu amigo, tentamos uma "vaga" na camionete que levava os fotógrafos. "Desce menino, aqui é só para imprensa", disse uma senhora. "Eu sou da Imprensa,tia", respondeu meu amigo. Junto com uma outra moça, meu colega sobe na camionete. Eu prefiri ficar transitando entre o vácuo criado entre fotógrafos e bandeiradores.

Durante o percurso não pude evitar um sorriso que escapulia pelos cantos de minha boca. Quanto mais o tempo passava, mais esquecia do meu objetivo ali, virava um Tiete. Na minha cabeça só passava o quão importante era Dilma naquele momento para o cenário político brasileiro. Já tinha esquecido de fotografar, meu objetivo agora era apertar a mão de Dilma. Passei por toda a hierarquia do poder: apertei primeiro a mão de João Coser, depois a de Casagrande para enfim apertar a mão de Dilma. Com a máquina em mãos, mudei a função para "gravar vídeo". Daquele momento em diante, comecei a construir o troféu que ostentaria durante alguns dias. Minha "entrevista exclusiva" com a Dilma.

Liguei a camera tremendo um pouco. A tremedeira era uma mistura de emoção junto com o empurra-empurra dos bandeiradores querendo que seus candidatos saissem na foto do jornal no dia seguinte. Falei para Casagrande: "Casagrande, fala alguma coisa para a camera", nem me lembro do que ele respondeu. Olhei para Dilma, quando cruzamos olhares, disparei: "Dilma fala alguma coisa para os estudantes da Ufes" e ela respondeu: "Vamos continuar lutando pelo futuro desse país". Neste momento, o sorrizinho que escapulia pelo canto da boca, tomou-a por completo.

Não era pelo o que ela tinha falado. Não era por ser ela quem estava falando. Minha alegria foi por estar, mesmo que indevidamente, dando um "furo" (será?) nos jornalões capixabas. Foi por estar sendo réporter.

Depois do discurso na Praça Oito, depois da caminhada, fui embora do evento aos gritos de "Olê, Olê, Olê, Olááá... Dilmááááa, Dilmááááááa". Sai dali com a certeza de que queria ser jornalista. Esqueci de todos os empecílios até então, a mochila pesada, o sol quente, o empurra-empurra, o ônibus que pegara para ir e o que pegara para voltar. Quando cheguei em casa, pude enfim sentar e sentir aquele alívio de dever cumprido. Não por ter feito a primeira espécie de reportagem. Mas dever cumprido por ter feito com maestria a escolha de minha carreira.

31 julho 2010

Diário de Bordo: nas veias do Brasil


Durante três dias viajei, de caminhão, de Cachoeiro do Itapemirim à São Paulo. Nesses três dias pude perceber as características e falhas do sistema de transportes brasileiro. Características que vão além de atingir apenas empresários e empregados do setor, elas influenciam e ao mesmo tempo refletem a sociedade brasileira. Há uns dois anos, sempre que passo muito tempo em casa viajo com meu pai, a fim de esparecer e matar a saudade. Ele que é caminhoneiro há bastante tempo sempre discutiu comigo a respeito de economia e política, dando exemplos visíveis a cada paisagem vista da cabine de um caminhão.

Saímos de Cachoeiro do Itapemirim carregados de mármore. A "Princesinha do Sul" como a cidade é conhecida, ganhou esse apelido no auge do café nos primeiros anos do século XX por sustentar a economia capixaba. Hoje a cidade ainda faz jus ao apelido, não por causa do café, mas devido à exportação de mármore. A cidade respira essa atividade. Cercada por montanhas, é possível ver de longe as paisagens com morros pela metade, resultado da exploração. Logo na entrada, também se vê várias marmoarias serrando imensas pedras. Muitos caminhões são vistos circulando pela cidade, não é difícil achar um membro de família que não seja caminhoneiro ou que tenha algum envolvimento com a atividade por aqui. Praticamente 100% dos fretes oriundos da região, são para o transporte de mármore, seja cortado em chapas, em pedras, ou no produto final como pisos e pias. Isso atrai não só os caminhoneiros locais, mas caminhoneiros de outras regiões como Minas Gerais e Bahia. Fica então um clima, escondido é claro, de faroeste. Os caminhoneiros locais não gostam muito dos forasteiros, pelo fato deles se aproveitarem dos fretes da região, ocupando o espaço dos motoristas moradores do município.

A viagem então começa. A primeira parada se dá após o centro da cidade de Campos dos Goytacazes-RJ. A região é formado de pastos e de população predominantemente negra, heranças de uma das cidades mais prósperas do período açucareiro do Brasil. A cidade é razoavelmente desenvolvida mas enfrenta a tradicional desigualdade brasileira. Com alguns quilômetros de distância, estão os prédios altos dos representantes dos petroleiros, agricultores e dos meios de comunicação do norte do estado; logo após estão várias casas coladas umas as outras, expremidas entre a ferrovia e a BR 101. A estrada recentemente passou a ser de responsabilidade da consercionária Autopista Fluminense, que atua da divisa com o Espírito Santo até a cidade do Rio de Janeiro. Antes esburacada e com sinalização precária, agora melhor sinalizada e com buracos menos evidentes, a estrada mostra os planos de sua administradora com o ínicio das obras de duplicação. A privatização de estradas torna-se cada vez mais comum no Brasil, com as dificuldades de se investir em infraestrutura o governo libera frequentemente conceções as empresas. O principal acesso dessa região entre o Rio de Janeiro e São Paulo é feito quase que 100% por empresas privadas, custando cada vez mais caros para os viajantes. A região também é uma das mais perigosas do eixo Rio-São Paulo, tanto sobre assaltos como de acidentes. Caminhões carregados com pilhas de 4 metros ou mais de lajotas, reduzem a velocidade da pista. Com isso, as freadas e ultrapassagens são constantes. Além disso com menos velocidade exigida, os motoristas ficam mais vulneráveis a assaltos. Também se comenta as consequências da recessão econômica. Talvez acostumados com o ritmo acelerado que o Brasil vivia anteriormente, hoje se diz que as pistas não estão tão movimentadas como antes, que as cargas não eram tão abundantes como anteriormente. Muitos caminhoneiros passam vários dias em pátios de postos de São Paulo e Rio de Janeiro à espera de carga para voltar para casa.

Outro fator que vem prejudicando os motoristas, é a "função de Bode Espiatório" que vem lhes sendo aplicadas. Diante dos problemas de trânsito, os governantes privam cada vez mais caminhões e carretas de circular nos centros urbanos, tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, existem regras bem específicas para o circulação desses veículos. Recentemente foi anunciada mais uma restrição a eles em São Paulo. O prefeito Gilberto Kassab proibiu o tráfego de caminhões em parte da Marginal Pinheiros, importante acesso de São Paulo. A restrição pode aumentar e atingir outras regiões, excluindo-os também da Marginal Tietê. Restrição igual existe no Rio de Janeiro. Em certos pontos da cidade apenas caminhões de mudança podem circular. O que acaba ocorrendo é uma certa maquiagem das cargas, que são misturadas com utensílios domésticos para burlar a fiscalização. A ponte Rio-Niterói também restringe caminhões durante maior parte do dia, sendo permitida a passagem deles apenas pela madrugada.

A restrição em São Paulo entrará em vigor nesta segunda-feira (2). Na quarta (28), estava em São Paulo e pude presenciar conversas à respeito da nova restrição sobre caminhões. Cientes do certo alívio no trânsito que a decisão dará, eles ainda assim acusam o prefeito de fazer pouco pela categoria, declarando posição contrária ao governo municipal. Dizem que os caminhões que prejudicam o trânsito são os caminhões da própria cidade, que sem manuntenção, quebram a todo momento em plena Marginal. Com isso, os caminhões de linhas interestaduais ficam presos a um horário pouco viável, gastando mais tempo em espera para transitar e ganhando menos dinheiro por não poderem fazer novas viagens. Citam ainda, a situação do Porto de Santos que durante a semana de mal tempo, paralizou as atividades portuárias, deixando vários caminhoneiros carregados, esperando na fila durante dias. Apesar do aumento das dificuldades a cada dia, os caminhoneiros não tem ajusto de frete, haja vista a grande oferta de trabalhadores da área. Em consequência disso, os trabalhadores passam a ganhar cada vez menos.

Muitos caminhoneiros ameçam uma paralização, porém diante da corrupção existente em seu sindicato, ficam enfraquecidos para mover tal ação. Motivos para isso não faltariam: Trabalho de mais de 18h por dia, Noites sem dormir, necessidade de tomar drogas para se manter acordado e cuprir horários, policiais rodoviários corruptos que ameaçam detenções em busca de propina, pedágios altos, falta de direitos trabalhistas, etc. Hoje, os operários estão bem sistematizados e se adaptaram a política brasileira de "manda quem pode e obedece quem tem juízo". Vítimas de uma politicagem cruel, a classe atravessa as dificuldades sem ter muito o que fazer. Educados sempre a obedecer as leis, foram negados também a educação para fazer valer seus direitos. Assim atravessam o Brasil inteiro, desamparados porém, tal como burros, carregando nas costas a importante tarefa de levar os produtos aos consumidores.

24 julho 2010

O velho jornalista Gabriel Garcia Marquez

No alto de minha ignorância cultural, busquei ler algum clássico da literatura mundial. Escolhi um livro do autor colombiano, ganhador do Nobel de Literatura, Gabriel Garcia Marquez. Motivado por um título nada convencional, escolhi a pseudobiografia "Memórias de minhas putas tristes."

O livro narra a história de um velho jornalista (ou um jornalista velho ?), de uma cidade pequena do interior da Colômbia. Perto de completar 90 anos, o velho surge com um desejo tão bizarro quanto o título do livro, ele sismou que queria uma menina virgem, ainda na noite de seu aniversário.

Determinado, porém consciente da dificuldade de seu desejo, o excêntrico ansião pede ajuda de uma velha amiga, dona de um bordel. A senhora cafetina resolve se esforçar para realizar o desejo do velho e, lá pelas altas horas da noite, apresenta-lhe uma jovem operária da fábrica de botões local. Ao sentir a inocência da menina, mesmo através de sua maquiagem carregada e roupas vulgares, o narrador começa a recordar de toda sua vida.
A partir desse ponto é que o narrador começa a contar sua vida. Ao mesmo tempo que conta, o autor percebe que nunca amou de verdade uma pessoa. Apesar de ter se relacionado com diversas mulheres, o interesse parecia ser apenas carnal, usando-as para saciar as suas necessidades. Mas com a garotinha, de 13 anos, ele sente mais do que o interesse pelo seu corpo jovem e "firme". A ingenuidade e delicadesa da menina provocam no ansião um zelo tão forte, que o velho descobre o significado de um novo sentimento, nunca experimentado em seus 90 anos. A confirmação do seu desejo inicial não chega a acontecer. Ele sequer conversa com a menina, a não ser quando ela está dormindo na cama do cabaré, enquanto sussurra palavras românticas em seu ouvido e espera pelas reações de seu corpo. Enquanto isso, o jornalista velho passa a ser velho jornalista. Suas colunas antes que pareciam ser escritas por um velho rabujento, passam a parecer palavras de um velho sábio.

O livro poderia ser apenas um conto erótico, caso se leia apenas os primeiros capítulos. Porém no decorrer da trama, a história ganha os contornos de pseudo-autobiografia. Marquez que também é jornalista, parece estar contando sua história por meio de alegorias. Pelo fato de não apresentar muitos nomes no livro, e ainda por não conhecer o autor (meu caso), fiquei em dúvida até o fim do livro para saber se era ou não a história do autor.

A ficção é considerada um livro que foge muito do estilo do ganhador do Nobel de Literatura. Os mais radicais, inclusive dizem que o autor se vendeu ao mercado bibliográfico. Porém parece apenas que Marquez, assim como seu personagem, está experimentando coisas novas. A fim de descubrir quem sabe um sentimento diferente. Enfim, agora pude perceber que esta obra não irá servir de base para mim, se desejo conhecer o autor. Porém agora estou numa feliz obrigação, de ter que ler mais um livro desse fantástico (segundo a crítica) escritor que é Gabriel Garcia Marquez.

23 julho 2010

O que é o Futebol para nós.


Motivado pela Copa do Mundo, resolvi ampliar meus conhecimentos sobre Futebol. Percebi naquele momento, como o mundo e sobretudo o Brasil para por causa desse evento. Entre vários livros, escolhi "Futebol - O Brasil em campo" do então desconhecido para mim, Alex Bellos. A obra é um excelente registro do que o Futebol representa para nós brasileiros. O único meio de se fazer isso, era através de um olhar neutro. Não bastava ser jornalista, tinha que ser estrangeiro, nada melhor então do que um jornalista inglês, vindo da pátria mãe do futebol.

Encomendado por um jornal inglês, Bellos recebeu a missão de ser correspondente no Brasil e explicar para os britânicos o porquê do sucesso do esporte num país subdesenvolvido. Bellos não só invadiu como penetrou nas raízes do interior brasileiro, em busca de respostas das origens do modo de jogar que encantou e encanta o mundo inteiro. Diante de tanta pobreza e dificuldades, como um país arranja espaço para ser tão brilhante num esporte?

O livro é dividido em vários capítulos, contando histórias sempre baseadas na paixão pelo futebol e como ele interfere na sociedade brasileira. Mostra como o esporte fez sucesso aqui, por poder ser disputado em qualquer lugar plano com a presença de um objeto esférico, não necessitando de qualquer outro equipamento sofisticado, alcançando assim as classes sociais mais baixas. Disserta sobre as condições que tivemos para ser a maior potência mundial no assunto, defendendo a idéia que a miscigenação permitiu aliar novas características ao nosso estilo de jogo. Baseado nas idéias de miscigenação de Freyre, Bellos traça a ginga vida da herança negra. Além disso, diz que como os juízes davam mais vantagens aos jogadores mais ricos, o brasileiro aprendeu a desviar dos pontapés adversários sem perder a bola. Mostra como o brasileiro se divide, esquecendo de todos seus problemas quando o assunto é futebol, capaz de prefirir uma bola a um prato de comida.

Uma das características do livro é apontar o brasileiro como um povo invariavelmente criativo. Não só em jogo, mas na vida. Como em casos em que burlamos a lei para praticar o que mais gostamos, quando inventamos novas formas de praticar o esporte, com uma meia, entre árvores, numa mesa ou até mesmo com um time de carros. Criativos, até quando não estamos jogando, mostrando que o brasileiro torce de um jeito único, disposto e se passar como louco, apelando para deuses de todas religiões e tomando atitudes absurdas e impensáveis em qualquer outro país. Criatividade também, quando queremos usá-la para corromper, quando cartolas se baseiam em burocracias e brechas na lei em busca dos interesses de sua região ou clube. Mostra como a realidade de desigualdade e corrupção está presente também no futebol.

Bellos não esquece de citar também nossa rica história de conquistas de seleções e de clubes. Cita como as três Copas do Mundo conquistadas em 58, 62 e 70 ajudaram a confirmar o esporte como carga cultural brasileira. E ainda nos faz lembrar da triste final de 1950, onde um Maracanã lotado voltou para casa, talvez pela única vez em sua história, sem uma festa , sem um vencedor. Por fim Bellos traz capítulos abordando um tema polêmico, a cartolagem. Descreve a história de sua figura máxima, Don Eurico Miranda, e mostra a vergonha que é a nossa confederação de futebol. Para não fechar com um tom triste, traz a entrevista de um dos craques mais inteligentes fora e dentro de campo, o Doutor Sócrates. Com toda autoridade ao falar de futebol.

O livro é uma obra necessária a qualquer um que queira conhecer o futebol brasileiro, mas do que isso um documento histórico. Em sábias palavras de Juca Kfouri: " Um livro para brasileiro ver."

12 julho 2010

O dia em que todos quiseram ser Casillas


A história que Casillas viveu ontem (Domingo) parecia ter sido inventada por roteristas de Hollywood. O goleiro da Espanha mostrou para todos que é o cara da vez. Atual melhor goleiro de futebol eleito pela Fifa e ídolo de um dos maiores clubes do mundo, o capitão da Fúria foi alvo de inveja por muitos pelo o que viveu nesse Domingo.

O craque, apesar de novo, é considerado há muito tempo um dos melhores goleiros espanhóis de todos os tempos. Titular da meta do Real Madrid desde 2000 e, mesmo com as constantes contratações milionárias do clube madrileño, é considerado o maior ídolo do clube. Em 2008, levantou a taça de campeão da Eurocopa em 2008, com direito a gozação em rede nacional contra a Alemanha, nas semis. Em 2009, teve sua confirmação individual ao ser escolhido por ex-jogadores e dirigentes o melhor goleiro do mundo, mesmo com a dura concorrência de Júlio César e Buffon. Esse ano mesmo cercado de desconfianças, ajudou a levar a Espanha ao título mundial.

Durante a Copa do Mundo, a seleção espanhola foi duramente lembrada pelas últimas campanhas. Mesmo sempre apresentando um bom futebol, nunca havia chegado à uma final da copa. Aos trancos e barrancos passou para a segunda fase. Casillas foi criticado, ainda mais depois do gol tomado contra a Suíça, em que ouve um cochilo da defesa espanhola numa jogada de sorte suiça. A imprensa condenou a sua "falta de profissionalismo", devido ao fato de sua namorada se posicionar atrás da meta defendida por ele. Vista como coadjuvante pela imprensa, o futebol espanhol foi ofuscado pela brilhantismo apresentado pela Alemanha, ou ainda pelas eliminações de outras seleções campeãs. Mas isso só aumentou a dose de romance da conquista.

Com grande atuação, Casillas conduziu seu time a semifinal após defender um pênalti de Neri Cardozo no finalzinho do jogo. Na partida seguinte, teve a dura missão de segurar o badalado ataque alemão, cuja seleção era tida como favorita até então. Mais uma vez o craque fechou o gol e pela primeira vez em sua história a Espanha foi às finais. Durante a semana, provocou no povo espanhol o sentimento nacionalista. O país que ainda vive consequências graves da crise econômica, com cortes de gastos públicos e desemprego, esqueceu por alguns instantes seus problemas.

No jogo por duas vezes o jovem goleiro salvou, não só seu time, como seus companheiros após evitar dois gols frente-a-frente com o atacante Robben. Caso tivesse tomado um desses gols, provavelmente a zaga composta de dois zagueiros do clube arquirival do Real Madrid, Barcelona, seria culpada pelas falhas, hoje desprezadas. O jogo se encaminhava para uma dramática disputa de pênaltis. Até que aos 11 minutos do segundo tempo da prorrogação Andreás Iniesta abriu o placar ao marcar num remate à meia altura. Casillas não se conteve, foi às lágrimas ali mesmo. Alguns minutos depois, lá estava ele "como uma criança", segundo os narradores da tv, levantando a taça do mundo. Ao descer para o campo sua namorada, Sara Carbonero, no alto de seu profissionalismo, pediu para que o amado falasse mais sobre a conquista. O craque não titubeou, deu a resposta que todos queriam ver em todo o mundial, lascou um beijo-surpresa em Sara, para surpresa da mesma.

Assim, com um pouco de felicidade por ele e também inveja, o mundo voltou os olhos para a seleção espanhola e Iker Casillas. E ainda em meio as comemorações em Madrid, todos se perguntam: por que não sou eu ali? Quem me dera Deus se ontem eu fosse Casillas.

07 junho 2010

Inovações e tendências do Futebol


Na era de desenvolvimento tecnológico, o futebol acompanha a evolução da ciência. O esporte mais popular do mundo, há muito tempo deixou de ser aquele modelo clássico, onde um jogador fazia toda a diferença para se tornar num esporte mais dinâmico, que emprega várias pessoas e movimenta um grande capital no mundo. Hoje, preparadores físicos, chuteiras, máquinas, computadores, enfim uma série de coisas, fazem parte da organização das equipes profissionais. Os jogadores ainda são o centro das atenções, mas a cada dia o mundo reconhce a importância da infra estrutura que existe por trás de uma partida de futebol.



Condicionamento Físico

Estudos revelam que durante uma partida oficial, um jogador de linha corre uma média de 10 a 12 km; que perdem por partida de 3 a 7 kg, em sua maioria água e sais minerais; e que a temperatura de seu corpo chega aos 40° C. Diante de tanto esforço físico, se pergunta o quanto cada jogador pode se exercitar sem por em risco sua saúde? Para garantir a integridade dos atletas, existe atualmente uma série de equipamentos e exames que detectam qualquer irregularidade. Muito além disso, fazem com que o jogador tenha resultados melhores. Não é díficil achar em clubes de ponta aparelhos que medem a capacidade aeróbica de jogador por jogador, sua simetria muscular, etc.


Os jogadores atuam no futebol cerca de 10 anos, realizando 70 partidas por temporada em média. Seus corpos sofrem constantemente com pancadas, impactos, corrida, mudança de direção, entre outras coisas. A parte que mais sofre com isso é o joelho. O desgaste das articulações começam a incomodar o jogador quando chega a uma certa idade. As lesões musculares e os ligamentos rompidos tornaram-se constantes no futebol. Mas nem sempre foi assim. Há alguns anos atrás, uma lesão "simples" dessas resultava na aposentadoria dos jogadores. Hoje com os avanços no tratamento dessas coontusões, permite que um atleta possa voltar a exercer suas atividades dentro de alguns meses.


Material esportivo

Num mercado que movimenta grandes quantias de dinheiro investidos em atletas, ninguém quer correr o risco de perder um jogador por lesão. O atleta custa muito caro, se ele não jogar isso representa um grande prejuízo. Para solucionar esse problema, os pesquisadores inovam a cada dia com materiais mais modernos. Por exemplo o uniforme, hoje ele é feito de uma fibra chamada poliéster. Essa fibra permite que o atleta traspire sem que seu corpo fique muito molhado, que poderia resultar num certo descoforto. O material absorve esse suor, sem que entretanto a camisa fique colada ao corpo, como acontecia quando o uniforme era feito de algodão.

Além dos uniformes, as chuteiras evoluiram bastante. Antigamente ela era feito de couro com cravos que priorizavam a aderência no gramado. Porém, essa aderência causava muitas vezes lesões devido a maior pressão nas articulações nos movimentos dos atletas. Agora a chuteira é feita com cravos redondos que possibilitam menos risco e mais mobilidade. As suas costuras são feitas pensando não só no conforto do jogador, como também no efeito sobre a bola durante o chute.


Arbitragem

Muitos esportes utilizam o computador para tirar dúvidas da arbitragem. A medida pretende dar a maior justiça nas decisões e não prejudicar os participantes. Mas no futebol essa modernidade não é bem aceita. As organizações mundiais temem que o jogo perca emoção. E pedem inclusive, em muitos casos, que as emissoras de tv limitem suas críticas em cima dos juízes que tem que agir com uma certa rapidez e precisão. As equipes de comentaristas possuem várias ferramentas que o juíz não dispõe, suas críticas tiram a autoridade da figura do juíz. Porém, ao mesmo tempo os seleciona mais, com uma maior exigência os árbitros precisam estar cada vez mais preparados.

Outra questão é o conceito de falta que é diferente em cada região. Por exemplo, no Brasil os árbitros são conhecidos por marcar certas faltas que são ignoradas na Europa. Pouco se comenta sobre isso, mas geralmente os jogadores que atuam no cenário brasileiro acabam tendo uma maior longividade, que talvez possa ser associada a essa atitude da arbitragem.


Futuro

As inovações tecnológicas apontam para um futuro de jogadores mais inteligentes. Além do talento, eles precisaram cada vez mais de ter certos conhecimentos sobre estudos a fim de melhorar seus rendimentos. A estratégia, a anotomia de seus corpos e os efeitos da física são algumas das coisas que os jogadores de hoje, mesmo que superficialmente, já conhecem. A tendência é que isso aumente cada vez mais.


O futebol não é mais o mesmo. A evolução da ciência mudou muitos parâmetros desse esporte, não se sabe se para melhor ou para pior. Uns dizem que não é mais tão bonito, outros dizem que está mais competitivos. Mas uma coisa não se pode negar: ele se tornou mais dinâmico.

Rio Branco, a Fênix capixaba


Na tarde desse sábado, 7 de junho de 2010, o ES pode sentir novamente o que é o futebol. Devemos reconhecer a fraca identidade do povo capixaba com o futebol da nossa terra. Porém, mesmo enfrentando a desorganização, pode dar a esse povo ingrato uma tarde digna de uma decrição de Armando Nogueira e Nelson Rodrigues. Como manda o figurino, o Rio Branco foi campeão capixaba com tudo que uma final emocionante tem direito.


Um dos clubes mais tradicionais do estado, o Rio Branco passa desde 2006 por uma renovação. Esquecido naquela época ou lembrado apenas por um passado glorioso porém distante, não estava sequer na segunda divisão capixaba. Endividado foi obrigado pela segunda vez em sua história a ceder sua casa, o Cléber Andrade em Cariacica, para o estado. Como cedeu anteriormente para a construção do Cefetes sua sede em Jucutuquara. O maior detentor de títulos do campeonato capixaba começou uma caminhada rumo a glória.


Voltou para a capital. Reconstruiu seu plantel com jogadores promissores e veteranos. Rapidamente a torcida voltou a encher os estádios. Ronicley, o atual camisa 10 e capitão do time, logo ganhou a identificação com o time e hoje atua como o líder da equipe. Equipe essa, que em 2008 chegou às finais da Copa Espírito Santo perdendo para a rival Desportiva. Em 2009 chegou às finais do Campeonato Capixaba, chegando a sentir o gosto de campeão, seguido da decepção de perder no tapetão o título para o São Mateus. No mesmo ano, chegou novamente à final da Copa Espírito Santo perdendo para outro rival, o Vitória.


Em 2010 o time durante todo o campeonato fez uma exelente campanha. Porém os gritos de 25 anos de jejum ainda ecoavam nos estádios capixabas, vindo das bocas de seus rivais. A pressão nesse ano foi ainda maior. O time guerreiro novamente chegou as finais do capixaba, em um clássico rico em lendas e contos, o Vi-Rio. Havia tempos que os dois maiores clubes da capital não chegavam juntos a uma final de competição. Mas tudo isso foi recompensado.


O primeiro jogo, disputado no Engenheiro Araripe, lotou o estádio. Partida dura, os dois times se estudando e de canela Humberto, atacante do Rio Branco, coloca o Capa Preta em vantagem. O Rio Branco chegou ao segundo jogo podendo empatar. Novamente no Araripe, o primeiro tempo do segundo jogo foi tão truncado quanto o primeiro jogo, talvez com um maior proveito das poucas oportunidades por parte do Vitória. O senador Casagrande juntamente com outros 10 mil espectadores, além dos que preferiram assistir em casa viram um segundo tempo de muito nervosismo. Na metade dele, o Vitória se viu prejudicado reclamando de um suposto gol de Leandro, que segundo o juíz o goleiro Walter tirou em cima da linha. Logo depois Nem foi expulso, diminuindo as esperanças do time alvinil. Mesmo com o jogo "controlado" após a expulsão, o nervosismo não diminuiu. Os torcedores riobranquenses esperavam para soltar o grito entalado a 25 anos. Era tanto nervosismo, que o treinador Dé Aranha da equipe alvinegra, ídolo no passado, não aguentou e desmaiou com a queda de sua pressão. De dentro da ambulância, viu o juíz apitar o final da partida para festa do Capa Preta.


Em vários pontos da Grande Vitória, foi possível ver a festa nas ruas que aquele momenta estavam alvinegras. Crianças e adolescentes que nunca haviam visto o Rio Branco campeão, puderam sentir a força de sua torcida. Senhores de cabelos grisalhos, puderam se lembrar de uma sensação que quase haviam se esquecido. E assim, o Rio Branco usufruiu do efeito Fênix, para se recolocar dentro da tradição do futebol capixaba.

05 junho 2010

Aumenta o "policiamento" em Campo Grande


Há algumas semanas os frequentadores de Campo Grande estão se sentindo mais seguros. Tudo porque o contigente de policiais cresceu bastante, devido a entrada de recrutas no batalhão local. Os novos oficiais alteram duplas para cobrir toda a extensão da avenida Expedito Garcia, a principal do bairro. Porém não são todos moradores do bairro que dispõe dessa sensação. Nas zonas residenciais fora da avenida principal o policiamento não faz ronda.


Desde que começou a nova ronda da Polícia Militar, as localidades mais residenciais ficaram abandonadas. As outras ruas do bairro Campo Grande ficam abandonadas. Os contribuintes se sentem marginalizados, já que os maiores gastos da prefeitura no bairro acontecem na área comercial. Mesmo sendo considerado o centro de Cariacica, Campo Grande possui um corrego, que hoje se transformou num imenso esgoto a céu aberto. Após 50 anos de urbanização do bairro, não há um sistema de esgoto que atende a todo o bairro.


Enquanto isso, a avenida recebeu uma calçada nova. Investimento que durante vários meses causou transtorno e até mesmo um certo trânsito. No Natal recebe um moderno sistema de iluminação, tudo que atende da melhor forma os comerciantes. Enquanto que os moradores não tem a sorte de receber tratamento semelhante.

31 maio 2010

A primeira caravana é inesquecível


A primeira vez a gente não esquece. Eu como corinthiano há muito tempo queria ir ver um jogo do Corinthians. Nessa narrativa vou tentar expressar tudo que vivi para ir ver um jogo, com a riqueza de detalhes que minha memória permite transmitir.
Estava em clima de fim de férias naquela época, um misto de decepção e entusiasmo. Decepção por sentir que não havia aproveitado o bastante. Entusiasmo por querer que comessase as aulas logo para rever amigos. Foi então quando olhei no meu Orkut a comunidade da Camisa 12 - ES. Eu havia entrado nela sem nenhum motivo, apenas para me fazer presente e ajudá-la a crescer, nada além disso. Nela tinha mais um tópico de caravana, dessa vez para o Maracanã. Eu como corinthiano fanático, com o perdão do pleonasmo, nunca tinha ido a um jogo do Corinthians. Passei perto quando o Vilavelhense quase passou para a segunda fase da Copa do Brasil em 2007. Por um gol aos 47 min do 2° tempo o Vila foi eliminado. Era o mais próximo que eu havia chegado. Enfim, aquele tópico não era a primeira caravana que nossa torcida fez. Houve outras oportunidades. Porém, por puro preconceito dos meus pais, nunca conseguira "colar numa caravana" como nós torcedores costumamos dizer. Discuti muitas vezes com minha mãe a respeito disso. Mas dessa vez eu estava disposto a realizar uma das maiores aventuras da minha vida, tão sem graça até ali.

Olhei o preço: 230 reais. Exitei. Conferi minhas finanças e, juro pelo Corinthians, haviam EXATOS 230 reais! Era muita coincidência. Decidi. No domingo anterior ao jogo, liguei para o então presidente da nossa torcida, Anderson Donadoni. Falei com ele se ainda havia vaga para a tal caravana. A ÚLTIMA VAGA. Estava tudo dando certo. Fui ao bar em Jardim da Penha, onde nos encontravamos. Meu primeiro contato com o número superior a três corinthianos em um jogo. Era Corinthians x Santos, jogamos com o time reserva e perdemos por 2x1. Esse gol de honra corinthiano era o que eu precisava. Já estavamos perdendo de 2x0 e , sinceramente, não tinhamos muita condição de empatar aquele jogo. Mas diga isso para um corinthiano, não é palpavel sequer de reflexão. Acreditava numa virada épica, mesmo num jogo sem nenhuma importância. Foi quando em um bate-rebate, Renato, 18 anos e no primeiro jogo como titular fez o gol. Extase em Jardim da Penha. Senti um arrepio que nunca havia sentido. Comemorar um gol com outros corinthianos, novidade para mim. Valeu a ida ao bar. Era só a confirmação que eu estava fazendo a coisa certa. Paguei a caravana depois do jogo. Lembro do Anderson, o presidente, conferindo nota por nota. Eram notas pequenas, como eu disse era as economias de um semestre inteiro de um adolescente que não ganhava mesada. Quantos recreios em Jejum para juntar tal quantia. Coisa de corinthiano maloqueiro.

Durante a semana, precisei inventar um álibi. Poucos eram os cumplices: Welber, Rodrigo e Grilo. Colegas de classe que eu conhecia há poucos meses, mas já depositava uma confiança de anos de amizade. Elaborei um plano de fuga. Para minha mãe, eu iria para uma chácara comemorar o aniversário de um amigo. Não lembro o nome inventado do amigo, mas tive o cuidado de não por em jogo a integridade de nenhum conhecido. Estava tudo combinado, sábado dia 7 de agosto de 2009 eu iria viajar depois da missa. A missa acabava às 20h e eu precisava chegar no bar às 22h. Apreensão. Terminada a missa, me despedi peguei um dinheiro extra com mamãe. Como eu disse só tinha o dinheiro da viagem. Fui para o ponto de ônibus. Para não ser pego em flagrante, me antecipei um ponto antes, um pouco mais longe de casa. Esperava o T. Larangeiras, 1 hora se passou e ele não chegava. Mais apreensão. Fui informado que durante a noite ele não passava por ali. Já eram 21h 30 min. Os outros torcedores esparariam por mim? Tentei pegar um táxi. Ofereci tudo o que eu tinha no momento: trinta e poucos reais. Ele não aceitou a corrida. Corri tudo que pude até a BR 262, deserta àquela hora. Passei por um lava-à-jato abandonado onde fumantes de crack faziam sua noite. Tranquei. Havia um ponto ali perto, mas fiquei com medo de ser assaltado. Corri um pouco mais até o próximo. Em cerca de 5 min percorre praticamente toda extensão de Campo Grande. Fui de uma ponta a outra do bairro. Sentei e em alguns minutos chegou o ônibus. 21h 40min.

Durante a viagem fiquei torcendo para que ninguém desce sinal, que o trânsito estivesse livre, que o motorista corresse o mais rápido possível. Minha mãe ligava. Você está na estrada? Não mãe to na casa do meu colega. Que barulho é esse? É a Tv. Você tá numa festa né Rafael? Ehr... pra falar verdade estou, mas tá tranquilo. Olha lá em... Consegui me desvencilhar de um problema. Mas ainda precisava chegar a tempo no bar, local de saída. O ônibus chegou. Saltara na Praia de Camburi. Corri cerca de 1 km até o bar. Na costela esquerda sentia pontadas. Parecia meu pulmão querendo se expandir a tal ponto de sair do corpo, só para eu poder correr mais. Naqueles poucos metros, pensei em "tudo que vivera até ali(...)". Virei a esquina. Vi uma Sprinter. Ufa, consegui. Cheguei no bar, me apresentei e comecei a me enturmar, metade da saga eu completara.

Conheci um americano, Ethan. Pela primeira vez praticava meu inglês aprendido durante dois anos e meio no FISK. Ele não fazia idéia do que era futebol para os brasileiros, muito menos para os corinthianos, mas tinha sangue de maloqueiro. Ele havia saído da Carolina do Norte para rever um amigo brasileiro que fizera um intercâmbio lá e aproveitou para ir a um jogo de futebol. Ficou sabendo da nossa caravana e, assim como eu, "colou com a 12". Conheci também Yuri e sua esposa que era gremista. Descobri que ele morava há alguns minutos da minha casa. Futuramente seria companheiro em outra caravana. A viagem começou.

Outro ponto importante da minha aventura, eramos uma Sprinter contra uns 5 ônibus lotados de flamenguistas saindo do ES. Talvez fosse normal essa situação para alguns ali, mas para mim era arrepiante. Raça e Jovem, só os sanguinários. Odiavam o Corinthians pela rivalidade das maiores torcidas do país e mais ainda a Camisa 12, por ter roubado o bandeirão deles num confronto em São Paulo. Estavamos na casa do inimigo e em menor número. À paisana, ou como dizemos no nosso meio: sem a farda, a cada vez que paravamos a angústia era grande. Garganta seca e respiração pesada. Eles entoavam gritos de ódio, a gente tentava se mostrar assustados não como torcedores do Corinthians, mas para representar turistas que fariam um passeio no Rio de Janeiro. Não era acovardamento, só um adiamento do confronto. Feito o lanche, entramos na van e partimos dali. Risos. Depois de um certo nervosismo, descontração. Durmi e só acordei chegando na cidade maravilhosa.

Estávamos na ponte Rio-Niterói. O líder do nosso grupo, Ricardo, mostrava para o Ethan os pontos turísticos do Rio de Janeiro. Paramos no Habib's depois da capital, na Dutra. Era o ponto de encontro com os companheiros de SP. Eram 8h da manhã, fizemos um lanche ali mesmo e passamos um rádio para os caras. Previsão de chegada: 14h. Puta que pariu. Esperar até eles chegar aqui? O caralho! - disse Ricardo. Fomos para Copacabana. Sentamos na beira da praia e ficamos discutindo histórias do Corinthians. O melhor time, o título mais importante, o ídolo... a hora do almoço se aproximava. Fomos para um parque do lado do Maracanã, disseram-me que era uma tal quinta da Boa Vista ou algum assim. Almoçamos num quiosque, comida ruim e cara. E nem era um quiosque muito requintado, era um casal que atendia e aparencia do estabelecimento me lembrava os quiosques dos terminais de ônibus capixabas. Passamos o rádio de volta para os paulistas. Esperariamos ali mesmo no estádio. Não. Tinham que entrar todos juntos segundo a polícia. Por sinal, a polícia carioca odeia os paulistas e principalmente os corinthianos de torcida organizada, dá até para entender. Voltamos então para o Habib's, acho que era em Nova Iguaçu. Ricardo estava muito nervoso, ele que até então brincava com todos, não aceitou uma brincadeira de um outro colega. Ficou um clima tenso dentro da van. Todos quietos até o habib's.

Quando chegamos estavam todos lá: Gaviões, Pavilhão, Estopim e Coringão Chopp. Só não estava a Camisa 12. Ricardo ficou ainda mais irritado. Pensamos em sair junto com a Gaviões que ofereceu carona, mas os ingressos estavam com os outros. Saíram todos e ficamos sozinhos, em território inimigo. Muitos cariocas passavam e hostilizavam o nosso grupo. " Seus filhoxs daxs Púta" - disse um deles. Era só um e a gente em uns 15. Pensei em tirar satisfações, mas Ricardo mesmo nervoso aconselhou a não fazer isso. Meia hora de espera e eles enfim chegam. Tatuados dos pés a cabeça demostrando amor ao Corinthians, vieram cumprimentar a gente. Por ser uma torcida pequena se comparada a Gaviões e por nós sermos a única sede fora de São Paulo, eramos como filhos para eles. Senti que realmente era uma família, sem metáforas, no sentido denotativo. Após eles fazerem um lanche no Habib's e saindo sem pagar, maloquero é maloquero, fomos todos para o estádio uns 7 ônibus mais a viatura da polícia que fazia a escolta. No caminho novamente entoei cantos do Corinthians que só via na Tv e no youtube, sabia todos de cor apesar da inexperiência. Chegamos com uns 20 min de atraso. Naquele amaça-amaça que só quem foi ao Maracanã sabe como é, fui entrando. Era como uma espécie de túnel um pouco escuro o acesso a arquibancada. Aos poucos a luz radiava sobre nós, como nos filmes entrei no estádio e fiquei alguns segundos perdido numa outra dimensão, apenas olhando para o estádio. O jogo já estava rolando e lembro perfeitamente da primeira cena Elias correndo como um louco pra cima de um jogador do Flamengo. Caralho, é o Elias - pensei. O primeiro tempo rapidamente acabou, 0x0.

No intervalo a torcida não parou. Cantamos todos as músicas que eu vira na Tv e algumas que nunca tinha ouvido. Levanta o bandeirão! Olhei aquele pedaço gigante de tecido alvi-negro vindo em minha direção rapidamente. Lá embaixo o som fica mais compacto, o que arrepia ainda mais. Começa o segundo tempo, o Corinthians estava mal, o time era misto de reservas com titulares, sem nenhum entrosamento e nenhum comprometimento tático. Adriano faz o gol do Flamengo, vi a torcida deles explodir. É bonito realmente, mas para mim foi mais um arrepio porém não bom de sentir. Foi como uma facada nas costas, senti uma imensão queimação dentro do meu corpo. Torci por um empate, mas realmente não era o nosso dia. O jogo acabou e precisamos esperar umas duas horas para sair a torcida do Flamengo. Voltamos todos meio cabisbaixos. A ida que tinha sido animada e descontraída, apesar do nervosismo, não parecia com a volta. Só havia silêncio e um pouco de desanimo. No outro dia era segunda-feira, muitos trabalhavam. Na van todos durmiam, tentando relaxar após tanta coisa que havia acontecido. Eu também estava cansado, iria para a escola no outro dia em dois períodos. Porém, naquela van silenciosa, depois de toda depressão pós derrota, refleti sobre o que estava sentindo. Era uma depressão pelo Corinthians, estava triste pela derrota, mas estava feliz porque me sentia corinthiano. Se for para sofrer que seja pelo Corinthians então, pensei.

Foi uma derrota, não foi perfeita a minha aventura. Mas foi a primeira. Jamais vou esquecer do dia que sai escondido de casa para ver o jogo do Corinthians quando tinha 17 anos. Parece uma coisa simples para muitos, mas diante das dificuldades que enfrentei, foi uma aventura e tanto. Aqui está esse relato, para que eu não perca esse acontecimento da memória. Um dia contarei para meus filhos e netos, num domingo após o almoço, essa história que vocês acabaram de ler, com a mesma riqueza de detalhes.