22 maio 2013

Cenários - as reflexões que tive acampando no Pico da Bandeira


Enfim realizei algo que já desejava há pelo menos dois anos: chegar ao topo do Pico da Bandeira, o terceiro ponto mais alto do Brasil. Junto de outros quatro amigos planejei a viagem durante um mês, nos preparando porcamente para subir e passar uma noite no ponto mais alto da Serra do Caparaó. Pela falta de dinheiro e experiência em fazer trilhas desse tipo, enfrentamos algumas dificuldades que até poderiam ter impossibilitado cumprir o objetivo, mas pela disposição de nossa idade conseguimos chegar bem até o final.

Porém o que mais me impressionou nisso tudo, e o fator que deve levar tantas pessoas a se interessar em subir a montanha, é a efemeridade da existência humana. Por sermos seres sociais e condicionarmos nossa existência a mudar o ambiente que vivemos, nos acostumamos aos cenários que nossos próprios antepassados criaram. Nossas cidades, nossos prédios, nossos carros, nossos objetos, todos produzidos há poucas décadas. Tudo recente. Ao encontrarmos um item com mais de 50 anos, automaticamente já o consideramos como algo estranho, pertencente a um mundo onde tudo era diferente.

Durante as seis horas de subida, passando por caminhos irregulares de pedras pontudas, longe de todo conforto a que estava adaptado, de tudo o que pensava precisar para sobreviver, percebi o mundo de um jeito que ainda não o entendia. Aos poucos, as espessas névoas foram ficando para trás. Concentrado em onde pisar, com o olhar voltado para o chão e a respiração cansada, mal pude ver as nuvens se dissipando e o céu abrindo. Era bem na hora do crepúsculo, estava em uma posição acima das nuvens, um horizonte avermelhado e triste que só tinha observado das vezes que viajei de avião. Confesso que o achava estranho, e por vezes até entediante, aquele céu limpo, literalmente vazio. Não havia montanhas, não havia prédios, nem árvores e nem nada ao alcance dos olhos.

Com o acampamento montado meus amigos foram dormir. Com frio e sem sono, resolvi sair da barraca. A lua crescente e vistosa que figurara no céu desde a minha chegada desapareceu. Sem a luz da minha lanterna, tudo se resumia a um mundo bidimensional. Enxergava apenas o céu em um tom negro, repleto de incontáveis estrelas, e a massa negra e opaca do terreno, sem nenhuma luz sobre ele, o que me impede até de chama-lo de sombra.

Ali, pela primeira vez, tive noção da existência do universo. Das estrelas que já estavam lá a milhões de anos e daquelas que emitiam sua imagem sem nem ali estar mais. Aquele mesmo céu foi visto por gerações que nem foram descobertas ainda. Aquele cenário viu o nascer do mundo. Toda a história que conhecemos, todas as preocupações que temos, tudo o que desejamos ser, tudo o que passamos, as guerras que aconteceram, as evoluções que tivemos, o que destruímos, o que construímos, os amores que vivemos, tudo não passa de mais um pontinho naquele céu, naquele cenário, que no momento está aceso, mas um dia vai se apagar, enquanto outro pontinho se acende.

Pensando nisso, naquela noite, me dei conta que não há nada que devo me preocupar. Toda decepção que eu tiver, todos os erros que eu vier a cometer, ou ainda que eu tenha acertos, tudo isso não será nada nesse cenário. É como se as cidades que criamos fosse uma forma de nos enganar e acreditarmos que o que fazemos será de alguma forma importante dentro daquele recortezinho que nos convencemos de que é o mundo. Enquanto que o universo permanece ali, imenso, rindo, desse ser tão pequeno e convencido que somos. Seres atrapalhados, seres perdidos. Heh