20 novembro 2010

Chatô, o rei do Brasil



Um jornalista que sabia mais do que ninguém usar a imprensa como o quarto poder de um governo, esse era Assis Chateubriand imortalizado na obra de Fernando Morais. “O homenzinho mais fantástico” que Elza Maxwell já conheceu era um sujeito astuto que por muitos anos permaneceu no encalço de presidentes com suas opiniões sempre exageradas. Taxado de antiético, chantageador e mau caráter Chatô colecionou inimigos ao longo de seus 76 anos de vida. Fundou os Diários Associados, uma rede de jornais, rádios e emissoras de TV comparada a de William Hearst (o suposto Cidadão Kane). Escreveu quase que até o último dia de sua vida. Em 1960 ficou tetraplégico, falecendo em 1968, depois de agonizar durante anos com a esperança de um dia voltar a ser o enfurecido jornalista que fora até ali.

Assis Chateubriand nasceu na Paraíba e foi criado em Pernambuco. Ainda criança enfrentava dificuldades em se comunicar por ser gago. Fato que o levou a ser alfabetizado já com nove anos. Formou-se em Direito e passou a escrever artigos em jornais pernambucanos. Aos poucos ganhava fama por não medir palavras e disparar ataques a autoridades locais. Defendeu sempre o liberalismo econômico e o interesse das empresas o que fez com que ganhasse amizades entre a elite nordestina.

Conquistou seu espaço no Nordeste, mas percebeu que ali estaria longe dos principais acontecimentos do Brasil. Mudou-se então para São Paulo, decidido a um dia ter seu próprio jornal. Chatô, que não era bobo, sempre esteve ao lado de industriais, banqueiros e burgueses, defendia os interesses destes em seus artigos. Por esse fator, ganhou a simpatia da elite cafeeira. Mesmo sem ter dinheiro, conseguiu convencer os cafeicultores paulistas a financiar a compra de um jornal para defender os interesses burgueses na capital paulista. Assim, ainda com 21 anos tornou-se dono do O Jornal.

Ciente que não poderia pagar tal investimento, Chatô propiciou a seus parceiros uma sociedade onde todos seriam acionistas do ainda imaturo Diários Associados. Isso virou característica do jornalista, sempre convencendo investidores a injetar dinheiro em seus projetos megalomaníacos, Chatô conseguia realizar grandes projetos sem ter dinheiro. Além da rede de jornais, criou o projeto “Dê asas a juventude” que convencia empresários a doar aviões para a pequena frota brasileira e o Museu de Arte de São Paulo, o Masp.

Temendo a força que os Diários Associados ganhavam, os políticos brasileiros passaram a respeitar Chateubriand. Cada vez mais, o jornalista se afirmava no cenário político como peça fundamental para se obter vitórias. Sem nenhuma vergonha, vendia matérias para candidatos ao governo que quisessem aparecer em um de seus jornais. Os que não tinham o apoio de Chatô sofriam com constantes ataques em artigos publicados em toda rede do jornalista. Assim, ele passou a figurar nos bastidores dos principais acontecimentos históricos do Brasil.

Em sua vida particular Chatô não obteve o mesmo êxito da carreira profissional, e nem o quis. Ao longo de sua vida ele teve dificuldades para viver em família. Sempre colocou o trabalho a frente de qualquer outra coisa. Suas esposas eram abandonadas em mansões, assim como seus filhos que nunca se deram muito bem com o pai. Sua vida pessoal foi sempre cercada de escândalos, que chegavam desde as manchetes dos jornais da oposição até o gabinete do presidente.

Com suas empresas ganhando cada vez mais poder, Chateubriand se mostrou um homem autoritário. Usava seus jornais como ferramenta política o que acabava por irritar seus repórteres. Por esse fator, Chatô perdeu grandes jornalistas como Samuel Weiner, Joel Silveira e Carlos Lacerda. Levava suas disputas políticas até as últimas conseqüências, chegando a cometer crimes que passavam impunes graças ao seu poder. Sempre teve consciência do que um jornal era capaz de fazer e usava isso como arma para conseguir o que queria.

Em 1960, Chatô sofre de uma trombose o que o leva ao coma. Passado alguns meses, enquanto muitos já esperavam sua morte, volta à lucidez com todo seu corpo paralisado. Tetraplégico ele passa oito anos agonizando em cima de sua cama. Ainda assim, escrevia quase que diariamente seus artigos com os poucos movimentos que podia realizar. Em 1968 morre vítima de uma parada cardiorrespiratória.

Na obra de Fernando Morais é possível observar toda a linha do tempo que envolve o jornalismo brasileiro. Desde os lendários Jornal do Commércio e O Pasquim, até os atuais poderosos O Globo e Folha de São Paulo. Mais do que isso o livro passa por toda a história política brasileira, contando os detalhes de golpes de estado, de conchavos, de bastidores e de histórias que marcaram a história. Apesar de a obra ser relativamente grande, ela é também rica, não deixando escapar nenhum detalhe por mais insignificante que pareça. O autor usa técnicas do Novo Jornalismo descrevendo cada cenário, desenrolando cada cena, escrevendo cada diálogo de uma forma que dá a impressão no leitor que o narrador presenciou tudo.

Chatô é uma obra biográfica que não se prende apenas a história do objeto analisado, ela flutua por toda a história brasileira, mas sem perder o foco no personagem. Um pouco pela peculiaridade da vida de Assis Chateubriand um pouco pela genialidade de Fernando de Morais, o livro acaba por ser uma obra obrigatória a qualquer aspirante a jornalista.

Nenhum comentário:

Postar um comentário